loader

Como 'O Pequeno Príncipe' influenciou autores brasileiros

  • Home    /
  •    Notícias    /
  • Como 'O Pequeno Príncipe' influenciou autores brasileiros

Como 'O Pequeno Príncipe' influenciou autores brasileiros

Clássico do também aviador francês Antoine de Saint-Exupéry acompanhou gerações inteiras por todo o mundo. Filosófico, ele inspirou uma nova maneira de escrever para os jovens, colocando-os no centro da narrativa. Pequeno Príncipe olha por uma janela do castelo Saint-Maurice-de-Rémens, no leste francês, onde se pretende criar um museu em sua homenagem. Rolf Haid/picture alliance (via DW) Com traduções em mais de 250 idiomas, acredita-se que O Pequeno Príncipe seja o segundo livro mais lido do mundo – só perdendo para a Bíblia. Assim, é inevitável que o clássico seja uma influência, consciente ou não, na literatura infantojuvenil brasileira. A obra do escritor e aviador francês Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944) gira em torno de um encontro inusitado: depois de um acidente aéreo no deserto do Saara, um pintor frustrado que se tornou aviador conhece um misterioso menino que se revela um alienígena, o habitante solitário de um asteroide. É o Principezinho. A primeira tradução para o português, do monge beneditino e escritor Marcos Barbosa (1915-1977), foi lançada no início dos anos 1950. De lá para cá houve muitas outras versões, e a obra nunca deixou de ser acessível a leitores e escritores. Para autores e especialistas, essa popularidade explica por que a obra acabou sendo um marco divisor da forma como se faz literatura para crianças. E traços dessa abordagem estão presentes em obras brasileiras fundamentais, como livros do Ziraldo e Ruth Rocha, para não falar do sem-número de releituras, sobretudo depois que O Pequeno Príncipe caiu em domínio público, em 2014. Ilustrações de Saint-Exupéry tornaram-se tão icônicas quanto seu texto. Dennis Van Tine/abaca/picture alliance (via DW) Dois pontos justificam essa grandiosidade do livro de Saint-Exupéry: a temática e a maneira de colocar a criança – no caso, o Principezinho – no centro da narrativa. É uma obra que se volta a um tema que abrange todos os viventes: a efemeridade da vida e a morte certa, comenta a tradutora e curadora Mônica Cristina Corrêa, considerada uma das grandes especialistas na obra. Diante da morte certa como algo universal, o personagem percorre mundos em busca de conferir sentido à vida. É quando descobre que a importância está em cativar e criar laços, para apreciar a natureza e os seres vivos. Praticamente todas as civilizações de que temos conhecimento buscam um sentido para a existência e precisam lidar com a finitude. E aí está, penso eu, a universalidade da obra, comenta Corrêa. Criadora do projeto Grandes Livrinhos, no Instagram, a jornalista Giovana Franzolin atenta para algo que, a julgar pela época em que o livro foi escrito, foi transgressor: a maneira como a infância é retratada, por meio do protagonista, como a contraposição ao universo do adulto. Há uma celebração da infância, que lembra [os livros do] Ziraldo, com essa coisa de colocar a infância sempre em destaque. Sobre a influência nos autores brasileiros, Franzolin recorda que nos anos 1950 em que a obra chegou às prateleiras nacionais, o mercado editorial daqui era rudimentar, em construção. Muito provavelmente, boa parte daqueles que se interessavam por literatura infantil, incluindo os autores e os ilustradores, em algum momento tiveram contato com essa obra. Tradutor de uma versão recente em português, o escritor e religioso dominicano Frei Betto conta que, já no final dos anos 1950, o livro caiu no gosto dos seus interlocutores: Sei que os religiosos de minha adolescência tinham muito apreço pela obra do Saint-Exupéry. Ele era um filósofo espiritualizado. Imaginação e filosofia Autor de No coração da Amazônia e dezenas de outros livros infantis, Manuel Filho comenta que todo mundo que se permite escrever com liberdade sempre se inspirará nas grandes obras de imaginação criadas por outros autores, e concorda que muitos escritores brasileiros foram influenciados pelo livro. Na literatura para as infâncias, é comum que a crítica fique em suspensão: temos animais que falam, flores que fazem amigos, crianças conversando com monstros, bruxos e fantasmas… Esse elemento da crítica está presente o tempo todo em O Pequeno Príncipe, e isso sugere que, olha só, podemos criar uma história livre. Digo isso, porque sempre existe uma forte censura pairando sobre a literatura infantojuvenil e há casos e casos em que autores extremamente talentosos, como Ruth Rocha e Ziraldo, criaram livros desafiadores como O Reizinho Mandão e Flicts. Saint-Exupéry integrou sua experiência de aviador em 'O Pequeno Príncipe'. epa afp filer/dpa/picture-alliance (via DW) Penélope Martins, autora de A Dona dos Ovos, entre outros infantis, avalia que há pelo menos dois elementos em O Pequeno Príncipe que se tornaram instrumentos essenciais na construção de uma poética com as infâncias: o diálogo intergeracional e a investigação filosófica. Como quem abre buracos para deixar respirar um carneiro que dorme dentro da caixa do imaginário, Exupéry faz da criança o movimento que anseia ler quem é, para ler o mundo. O editor Marcelo Duarte, também autor de O mistério da figurinha dourada e diversos outros livros infantis e juvenis, recorre ao primeiro capítulo de O Pequeno Príncipe para dizer que a obra o marcou para sempre: O narrador começa contando o desenho que ele fez aos seis anos. Os adultos não conseguem enxergar ali a figura de uma jiboia depois de ter engolido um elefante inteirinho. Preferiram dizer que se travava de um chapéu. Saint-Exupéry escreve que adultos nunca percebem nada sozinhos, e uma criança se cansa de explicar tudo. É com esse olhar curioso que se faz a literatura infantil e juvenil de hoje. Despertando a imaginação das crianças, mostrando o que só elas são capazes de enxergar, explica Duarte. A obra é tão conhecida que acaba influenciando até quem não gosta dela. Para o escritor José Roberto Torero, ela trouxe aspectos positivos e negativos ao fazer literário nacional. Teve influência positiva porque mostrou que a literatura infantil não precisa ser bobinha, fácil, e falar apenas para crianças. Negativa, porque deu a ideia de que a literatura infantil tem que trazer lições de moral. E isso é uma bobagem, comenta ele, que em 2020 publicou a paródia O Pequeno Plebeu. Torero conta que leu pela primeira vez o clássico por obrigação, no ensino médio. E não gostou. Para um adolescente, a ideia de 'ter de ser fiel a quem cativa' é uma prisão. E o suicídio no final do livro me pareceu uma saída covarde. Fiquei com essa raiva do livro meio escondida, até que vi o Ziraldo falando mal [da obra]. Aí fiquei à vontade para criticar e comecei a pensar numa sátira. O próprio Ziraldo também aludiu diretamente ao clássico de Saint-Exupéry em uma de suas obras, O Pequeno P.z Entre traduções, paráfrases, filmes e peças teatrais, 'O Pequeno Príncipe' já viveu numerosas encarnações. Na foto, o musical de Deborah Sasson e Jochen Sautter. Petra Schönberger/Geisler/picture alliance (via Dw) Cultura pop Diretor e roteirista do filme Dás um banho, Zé Perri!, uma ficção inspirada na passagem do escritor e aviador pelo Brasil, o cineasta e cartunista Zé Dassilva acredita que a influência de Saint-Exupéry sobre os autores brasileiros poderia ser maior, não só pelo aspecto filosófico da obra dele, mas também pelo fato de ter estado no Brasil. A presença física dele aqui não chegou a construir uma identidade maior dos autores brasileiros com sua obra. E também são muito raros, não só aqui, mas no mundo todo, autores que escrevam e ao mesmo tempo desenhem seus livros. Temos aqui a exceção de Ziraldo, compara Dassilva. A professora na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Leonor Werneck dos Santos, autora do livro Articulação textual na literatura infantil e juvenil, lembra que, além de influenciar outros autores, a obra também passou a ser parte de estudos acadêmicos e foi incorporada à indústria cultural: Principalmente agora que caiu em domínio público, aparece em camisetas, adesivos, memes. Há desdobramentos incríveis, tanto no meio acadêmico como na cultura pop. VÍDEOS DE EDUCAÇÃO

Publicada por: RBSYS

BAIXE NOSSO APP

Utilize nosso aplicativo para escutar JCB WEB RÁDIO direto de seu dispositivo movel.

img

Copyright © 2025 JCB WEB RÁDIO. Todos os direitos Reservados.